As Ideias são de Quem?
Calhou que, no dia em que salta a polémica do Rock in Rio Febras – festival vimaranense de música, admoestado pelo Rock in Rio Lisboa a mudar de nome – eu sentei-me para acabar de ver o "Mixed by Erry" (filme do realizador Sydney Sibilia, 2023).
O filme "Mixed by Erry", do realizador Sydney Sibilia, conta a história da construção do «império» dos irmãos Frattasio, assente no talento de Enrico ("Erry"), apaixonado por música e com um extraordinário engenho para elaborar «mixes» de música, ao gosto de cada um, gravadas em cassete. Depois de vermos o filme, as plataformas de música atuais parecem fraquinhas… Certo é que todas as plataformas que hoje usamos com naturalidade e intensivamente – convictos de que pagarão, devidamente, os direitos de autor a quem os devem – são herdeiras de uma ideia primordial – a de gravar cassetes com músicas de diferentes autores, «cassetes pirata».
E, claro, os festivais de hoje em dia também são outra coisa. Estamos em plena silly season e aquilo que era um pequeno festival da freguesia de Briteiros em Guimarães ganhou dimensão nacional, graças à ameaça da organização do Rock in Rio, que acusou o pequeno festejo de aldeia de "concorrência desleal" por usar o nome «Rock in Rio Febras». Mas a verdade é que o festival vimaranense tem rock e realiza-se, precisamente, junto a um rio: o Febras.
A propriedade intelectual consubstancia um conjunto de direitos que abrange as criações do conhecimento humanos – criações intelectuais – como a literatura, a música ou o nome de um evento. Uma ideia simples e, aparentemente, racional. Contudo, as correntes filosóficas criticistas hodiernas têm açoitado com veemência o pressuposto da propriedade das ideias, considerando que apenas a expressão dessas ideias pode ser objeto de proteção. (Os interessados poderão começar por ler o Professor de Filosofia da Universidade de Victoria, James Young em "Radically Rethinking Copyright in the Arts – A Philosophical Approach", Routledge, 2021).
Já agora, o artigo 27.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos estatui que "1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2. Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria." Todos, são mesmo todos.