O Médico e o Advogado
À partida, nada parece mais dissemelhante do que a prática de um médico e a de um advogado: o primeiro, na interpretação dos sintomas, na palpação do corpo, na urgência galopante de dores alheias; o segundo, na azáfama das representações, na meticulosidade dos seus livros, na ansiedade das suas performances intelectuais. Contudo, na sua essência, o ato do médico e o ato do advogado são uma e a mesma coisa: um ato de cuidado. E são uma e a mesma coisa também no seu objetivo último: transformar uma situação de facto, tornando-a mais equilibrada ou menos insuportável.
Quando somos muito pequenos, o mais importante das nossas vidas acontece de mãos dadas. Quando a juventude se desvanece, também aí ansiamos por outras mãos - mais fortes, mais seguras - que possam com carinho acompanhar os gestos que exigem precisão; apoiar os passos que se empederniram; aclarar a visão que se tornou turva, pelo tempo e pelo hábito. Ao longo da vida, porém, muitas mãos são necessárias - e não menos necessárias - para que a vida aconteça na sua plenitude. Nos momentos mais difíceis e de maior vulnerabilidade da idade adulta estaremos, se tivermos sorte, de mãos dadas.
O ato do médico e o ato do advogado são uma e a mesma coisa: um ato de cuidado pelo outro; a resposta a um apelo; uma mão que se estende.
Todo o que se empenha com amor no mínimo que faz, independentemente do lugar onde vai pousar as suas mãos sobre aquele que o chamou - para o empoderar, para lhe dar voz, para fortalecer o seu instinto de vida - sabe que assim é: o cuidado é o aspeto mais elementar da condição humana.